quarta-feira, 25 de maio de 2016

Sobre os livros de bolso em Portugal

À aproximação da Feira do Livro de Lisboa, algumas observações de relance sobre um assunto que ainda me estupefacta e para o qual ainda não encontrei uma resposta satisfatória (e acreditem que tenho pensado muitíssimo nisto, desde há anos): porque é que em Portugal não há um mercado saudável de livros de bolso?

A natureza do livro de bolso é ser um livro barato, que possa ser lido durante o dia-a-dia: nos transportes públicos enquanto se vai para o trabalho; nos bancos de jardim, à hora-de-almoço; e, evidentemente, em casa. É um livro feito a pensar em quem, de facto, deseja o conteúdo e não a forma; embora se possa privilegiar uma edição de bolso anotada ou comentada por especialistas, se for caso disso - facto que, em regra, não encarece em nada a publicação. Com efeito, são as sumptuosas tiragens dos livros de bolso - na ordem das dezenas ou das centenas de milhares de exemplares impressos - que baixam totalmente os custos de produção; os quais decrescem pelo facto de que, como consistem em livros de pequeno formato - octvavos ou quartos, por exemplo (e o quarto não é assim tão pequeno quanto isso) -, não precisam de encadernações robustas (que são caras). Basta-lhes uma simples capa de cartolina, colada na lombada. Olhando por cima do ombro para o passado recente lembro-me de algumas editoras que fizeram um magnífico trabalho na edição de livros de bolso, mas quando olho em frente, para o presente, não vejo um labor idêntico (em número de editoras e em número de edições). O livro comum posto à venda em Portugal é um livro de médio formato, com valores de produção médios ou baixos e com um preço de venda ao público que se aproxima, na maioria das vezes, dos vinte e cinco euros. O preço relaciona-se directamente com a tiragem (em teoria..): um título do qual se imprime mil ou mil e quinhentas cópias - três mil, vá lá - não pode ter o mesmo preço de venda ao público que um título do qual se imprima cem mil ou trezentos mil exemplares. Isso é perfeitamente razoável, como é evidente. O que já não é tão evidente assim é a razão pela qual, no tal passado recente (vinte, trinta anos atrás), se podia encontrar uma deslumbrante oferta de livros de bolso nas livrarias.
Havia leitores para eles?
Se sim, onde estão?
Nunca existiram e editava-se por carolice - ou (colocando a questão de uma forma mais nobre) por espírito de missão? Seria proveitoso descobrir respostas expressivas para estas interrogações.

Por outro lado, o livro de bolso, infelizmente, nunca se libertou - em Portugal, pelo menos - da aura de coisa ordinária - de res rasca - que o impregna; pois, nas mentes da maioria dos indivíduos, se algo custa barato é porque não tem qualidade. Isto não é totalmente axiomático, pois cada objecto é orbitado por uma espécie de preço invisível, perspirado à sua aproximação e que alarma quando se está a pedir demasiado ou pouquíssimo: em ambos os casos, desconfia-se. O bom consumidor é, pois, uma criatura do médio, nunca dos extremos. Nessa óptica, se o tal livro comum descrito acima (de preço de capa de vinte e cinco euros) fosse apresentado a custar sete seria, imediatamente, recebido com sobrolho sublevado: sete euros será um preço natural, acessível ou convidativo, mas não é um preço, digamos, "prestigiante" (leiam, entre outros, Torsten Veblen ou Joseph Schumpeter para aprofundar esta problemática).

As respostas são esquivas, é certo. Mas também é certo que a cultura do livro de bolso, seja lá porque razão for, nunca medrou entre nós. Entre outros livros, resta-me comprar nos alfarrabistas essas pequenas e portáteis preciosidades editadas em antanho; e que, por vezes, até são as únicas edições que existem de determinados títulos que, entretanto, nunca mais foram eleitos para reedição - o que é lamentável.